domingo, 24 de março de 2013

A importância da gramática no relacionamento amoroso

Uma pesquisa norte-americana realizada com 5.481 adultos com mais de 21 anos acaba de revelar que norte-americanos solteiros elegeram os tropeços de gramática como uma das principais razões que arruínam um primeiro encontro ou o flerte com um potencial parceiro.
Encomendada pelo site Match.com, com sede em Dallas, a sondagem buscou definir um quadro dos 100 milhões de norte-americanos solteiros, 1/3 da população segundo Censo 2012, dos EUA.
O levantamento, divulgado pouco antes do carnaval de 2013, mostrou que, ao julgar um parceiro em potencial, tanto homens como mulheres colocam a gramática no topo da lista de "requisitos obrigatórios" de um relacionamento, com 55% de preferência, atrás apenas do estado geral dos dentes da pessoa (58%). Além disso, 19% dos homens entrevistados se sentem atraídos (ou repelem) mulheres com sotaque.
Vejamos os 10 critérios analisados para julgar pessoas interessantes em busca de relacionamentos:
1º  DENTES - 58%
2º  GRAMÁTICA - 55%
3º  CABELOS - 51%
4º  ROUPAS - 45%
5º  TER ( ou não ) TATUAGEM - 40%
6º  MÃOS/UNHAS - 37%
  SOTAQUE - 19%
8º  SAPATOS - 18%
9º  CARRO QUE DIRIGE - 13%
10º ELETRÔNICOS QUE USA - 9% 
Não podemos desconsiderar que, apesar de rigorosa, a pesquisa foi desenvolvida para fins comerciais e, portanto, não tem necessariamente validade científica. Dá, no entanto, ideia da dimensão de um fenômeno que pode ser mais comum do que se imagina. No Brasil, onde não há pesquisas do gênero, adultos com o mesmo perfil apontado pela pesquisa norte-americana expressam julgamentos  semelhantes. Entrevistado pela Revista Língua, Flávio Viana reclama da grande quantidade de mulheres por quem se interessa. Diz que,  ao iniciar uma conversa, decepciona-se com o linguajar trôpego.  
Logicamente, cada um escolhe os critérios para aproximar-se de quem o atrai. Mas, não se pode esquecer de que a língua é fenômeno social. Uma expressão ou palavra fora da convenção estabelecida por um dado meio indica desprestígio, falta de preparo ou cuidado. Dizer é criar uma imagem social de si. É ela que está em jogo quando se tropeça no registro gramatical pedido pela situação de comunicação - um risco se o interlocutor for um superior hierárquico, um potencial empregador, um leitor, um cliente ou até parceiro conjugal.
Devemos nos lembrar de que o sentido é construído pela seleção e combinação de palavras. E, ao selecionar as palavras a pessoa dá mostras de seu universo de referência, do lugar social de onde procede, suas preferências ideológicas e até seu gosto estético e amoroso. Indica o tamanho do repertório que a credencia a tornar-se interessante aos olhos de potenciais conquistas amorosas.
Por isso, todo cuidado é pouco!!!
Para saber mais: www.revistalingua.com.br

quarta-feira, 13 de junho de 2012

A sujidade que confunde

 Mesmo sujo, governo quer rio Pinheiros sem cheiro foi o desastroso título editado em 8 de abril no caderno Cotidiano do jornal Folha de S. Paulo. Tal título corre o risco de induzir o leitor a fazer mau juízo de instituições governamentais.
Deixando de lado a interpretação política resultante, apesar de o momento político favorecê-la, percebe-se que o redator não quis classificar o governo como sujo, já que fala do rio Pinheiros, tradicionalmente malcheiroso.
Mas pensemos na confusão que se pode criar em campanhas com manchetes e denúncias exibidas vapt-vupt em horário eleitoral, mostrando títulos sem contexto. Todo cuidado é pouco!
Melhor seria, portanto, o redator ter tido mais trabalho para achar solução, digamos, mais limpa, a fim de evitar equívocos desnecessários. Bastaria afastar o adjetivo "sujo" do respeitável substantivo "governo". Assim, teríamos: 
O rio Pinheiros sem cheiro, ainda que sujo, é a meta do governo.
Ou em jornalês telegráfico:
Governo quer rio Pinheiros sem mau cheiro, mesmo que sujo.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Curso de Letras: muito além da sala de aula

Trago uma boa notícia para aqueles que gostam de estudar a língua portuguesa, idiomas estrangeiros e suas respectivas literaturas e culturas: o mercado de trabalho para os egressos de Letras possui hoje uma diversidade de atuação impensável há alguns anos. Devido à crescente valorização da comunicação nas sociedades informativas, esses profissionais estão em alta e tendem a ser valorizados no mercado de trabalho.
Pensemos nessa atuação em espaços de trabalho distintos:
- em empresas, a procura pelo profissional de Letras é proporcional à consciência que as organizações adquirem sobre a importância da comunicação em seus negócios. Há um grande espectro de ação desses profissionais que vai de peças publicitárias a cartas comerciais, de redação de e-mails a de memorandos. Se bem redigidos, contam-se pontos favoráveis à empresa.
Nesse contexto, o profissional com conhecimento linguístico bem sedimentado atua a fim de mapear problemas em situações concretas de comunicação. Não se trata simplesmente de correções gramaticais: seu papel é o de mediador de processos comunicativos, capaz de perceber diferentes sentidos e nuances ideológicos e intervir de forma fundamentada, tendo como base as teorias linguísticas. Essas intervenções podem aprimorar todo o trajeto comunicativo das empresas, seja em linguagem escrita ou oral.
- nas editoras, a atuação é ainda mais ampla, pois o profissional em Letras faz-se presente em todas as etapas dos processos editoriais: seleção e edição de textos, redação e preparação de originais. Nesses casos, os materiais envolvem todo tipo de obras: literárias, científicas, com ênfase na produção de material didático e planejamento de coleções. As traduções também oferecem campo de trabalho fértil no cenário globalizante da atualidade.
- em novas tecnologias, a produção de textos digitalizados - CD-ROMs, tablets, e-readers, livros eletrônicos - está apenas começando a frequentar o mercado brasileiro. Esses acervos digitalizados requerem profissionais aptos a lidar com essa tecnologia, quer no aspecto de produção, quer no de revisão.
- em trabalhos realizados por autônomos, a tradução e a revisão podem atender a particulares. Ademais, sabemos que trabalhos acadêmicos, sobretudo dissertações e teses requerem redação cuidadosa. No mesmo contexto, várias instituições organizam revistas acadêmicas, cuja versão final deve ser impecável. Nessas situações, o profissional de Letras torna-se imprescindível.
em escolas, o profissional de Letras pode atuar como professor no ensino fundamental e médio. Muitos tendem a afastar-se dessa opção, afugentados pelos baixos salários da categoria. No entanto, vale lembrar que, ao lado das escolas públicas, colégios privados considerados de excelência pagam muito bem a esse profissional, além de oferecer estabilidade e plano de carreira estimulante.
- no ensino superior, ao profissional em Letras que deseja atuar em universidade, é imprescindível prosseguir os estudos em pós-graduação lato sensu ( cursos de no mínimo 360 horas) e stricto sensu (mestrado e doutorado). A docência é um mercado consolidado e em crescimento, como demonstram as relações entre educação e desenvolvimento econômico.
- em nível de língua estrangeira, o mercado de português mostra-se em franca expansão, tanto na atuação em escolas bilíngues como em instituições internacionais.
- em outros mercados: roteirista (por exemplo, a transposição crescente de obras literárias para o cinema, a televisão e os meios virtuais) resenhista, ensaísta, assessor cultural, crítico literário, intérprete, secretário bilíngue, redator de manuais técnicos, de sinopses de livros e filmes, de textos para internet.
Diante de tantas perspectivas de trabalho, num leque bastante amplo de opções, o quadro geral da carreira mostra-se abrangente e incentivador.  É, pois, momento de refletir sobre as reais possibilidades de atuação de um bom profissional em Letras .

terça-feira, 29 de maio de 2012

Vestibulares de inverno: a prova de redação

Pensando em ajudar os alunos a delinear o perfil de redação das universidades que realizam suas seleções de inverno nas próximas semanas, sinalizo as tendências temáticas dos últimos dois anos.
A Unesp prefere manter a tradição de pedir um texto dissertativo-argumentativo e apresentar uma coletânea de textos motivadores. Em 2009, aproveitando o sucesso do Twitter, a banca pediu redação sobre o tema Tecnologia e invasão de privacidade. O texto de apoio apresentava uma foto de Chico Buarque com uma mulher casada, tirada por um paparazzo. Já em 2010, cobrou a importância dos valores para a sociedade, apresentando uma pesquisa em que os brasileiros atribuem a situação do País, em áreas como educação e violência, à falta de valores morais. Em 2011, com a abrangência dos tablets, perguntou qual seria o futuro do livro.  
O Mackenzie não diz explicitamente o assunto da redação: pede uma dissertação que discorra sobre traços comuns ao material de apoio. Em 2009, a proposta de redação mostrou-se muito subjetiva: A eterna busca, em que o candidato deveria associar ideias dos textos ao seu repertório de conhecimento de mundo e conhecimento enciclopédico. Já em 2010, os textos de apoio tratavam da escassez e desperdício de água, e Tá com sede? foi a pergunta mote para a dissertação. Em 2011, o tema comum foi o gerenciamento do lixo urbano. A intenção foi mostrar a importância de Estado e cidadãos numa postura mais proativa em face ao problema.  
A PUC-SP aplica prova temática, de modo que todas as disciplinas e a redação giram em torno de um mesmo assunto. Em 2010, cobrou uma dissertação sobre a imagem que o brasileiro tem hoje da capital federal. O tema da redação de 2011 pedia que o candidato escrevesse uma carta para um jornal local, analisando as vantagens e desvantagens de sua cidade ser incluída no trajeto do trem-bala.
A FGV apresenta uma prova em que interdisciplinaridade, conexão de temas com a futura atuação do candidato e reflexão deverão estar associados. Em 2009, Janela demográfica exigia que os candidatos discorressem sobre fatores sociais, culturais e econômicos que pudessem explicar a tendência de queda da taxa de natalidade e as mudanças na pirâmide etária brasileira. Em 2010, a redação com tema Meritocracia baseava-se em um trecho de "A Ralé Brasileira", de Jessé Souza. Exigia que o candidato definisse meritocracia e apontasse como ela se manifesta no País. Barbárie e humanismo na Europa contemporânea foi o tema da redação de 2011. Cabia discutir xenofobia e resistência a uma sociedade multicultural.
O INSPER, pela primeira vez, vai pedir duas redações no vestibular. Os textos deverão ser dissertativos, tendo entre 10 e 30 linhas. A redação de 2009 cobrava uma reflexão sobre o papel da TV como o "atual ópio do povo". Em 2010, foi usada uma charge e trechos de "A hora da estrela" e "Dom Casmurro" para motivar o candidato a escrever sobre Solidão: perdas ou ganhos. No último exame, o tema foi O papel da mídia digital nas sociedades, exigindo do candidato seu conhecimento prévio, já que não apresentou texto de apoio.
A ESPM oferece ao candidato escolher o tema de sua redação entre duas opções. Em 2010, o primeiro tema focava o senso crítico necessário para achar informações confiáveis na web. O segundo abordou a China (sociedade e ambiente). Baseado em um texto sobre Bono, em 2011, o primeiro tema discorria sobre o apoio do artista a causas sociais e ambientais. Se preferisse, o candidato poderia escrever sobre o Brasil na economia mundial.
Sabemos que nem toda redação de vestibular é uma dissertação, e que nem toda prova tem só uma proposta de redação. Portanto, não podemos perder de vista que, para garantir uma boa nota em competência escrita, é necessário treinar também outras modalidades textuais. Isto significa escrever, escrever e escrever. Esse é o caminho que  coloca o candidato em larga vantagem em qualquer processo seletivo. Então, não resta outra saída que não seja o enfrentamento: vamos à luta!

terça-feira, 22 de maio de 2012

ROCK DIDÁTICO: SUJEITO SIMPLES

Já há algum tempo, professores de 3º colegial e de cursinho utilizam ritmos e melodias populares para ajudar os alunos a memorizar os conteúdos das disciplinas. A estratégia é bastante usada, principalmente, nas aulas de português, cuja gramática cheia de regras e exceções, às vezes, torna-se um obstáculo ao aprendizado. Foi a partir dessa ideia que dois músicos de Curitiba (PR) - Jessica Steil e Marcelo Darcini - pensaram em gravar canções, versando sobre alguns tópicos do conteúdo normativo da língua portuguesa que mais confundem a cabeça dos estudantes. Surgiu daí a banda Sujeito Simples, a primeira de que se tem notícia no gênero "rock didático". Canções como Preposição, Advérbio, Crase e Pronomes Pessoais, entre outras, brincam com conceitos caros à gramática da língua portuguesa, valendo-se de letras que reveem e fixam regras e ensinamentos do idioma sem deixar de lado os vocais e as guitarras distorcidas característicos do rock'n'roll.
Sem dúvida, é mais uma opção, descontraída e alegre, de se aprender um pouco mais a língua de Camões. 
Mais detalhes: www.sujeitosimples.com.br 

quarta-feira, 7 de março de 2012

Mulher: uma homenagem

No dia Internacional da Mulher, vale lembrar o respeito, a admiração, a reverência com que José Saramago tratou a mulher em seus romances: M. no Manual de Pintura e Caligrafia, Joana Carda em A Jangada de Pedra, Blimunda no Memorial do Convento, Maria Sara e Ouruana na História do Cerco de Lisboa.
Deixo um fragmento do Manual de Pintura e Caligrafia que pode corroborar o que aqui foi dito:
"Sempre fico espantado diante da liberdade das mulheres. Olhamo-las como a seres subalternos, divertimo-nos com as suas futilidades, troçamos quando são desastradas, e cada uma delas é capaz de subitamente nos surpreender, pondo diante de nós extensíssimas campinas de liberdade, como se no rebaixo da sua servidão, de uma obediência que a si mesma parece buscar-se, levantassem as muralhas de uma independência agreste e sem limites. Diante desses muros, nós, que tudo julgávamos saber do ser menor que viemos domesticando ou achamos domesticado, ficamos de braços caídos, inábeis e assustados.(...)
Quando os poetas românticos diziam (ou dizem ainda) que a mulher é uma esfinge, acertam, abençoados sejam. A mulher é a esfinge que teve de ser porque o homem arrogou do senhorio da ciência, do tudo saber, do poder tudo. Mas é tanta a fatuidade do homem, que à mulher bastou levantar em silêncio os muros da sua recusa final, para que ele, deitado à sombra, como se deitado estivesse sob uma penumbra de pálpebras obedientes, pudesse dizer, convicto:' Não há nada para além desta parede.'
Tremendo engano de que acabamos de acordar."
Mulher, parabéns!

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Portinari: Guerra e Paz

Fico feliz por abrir meu primeiro texto de 2012 com uma belíssima sugestão: conferir a exposição Guerra e Paz, de Portinari. Está imperdível!
São dois painéis, medindo 14x10m cada um, encomendados pelo governo brasileiro para presentear a sede da ONU, em Nova York. Entre 1952 e 1956, Candido Portinari dedicou-se com afinco no projeto, na excecução e na conclusão de seus últimos e maiores murais.
É surpreendente a abordagem totalmente inovadora criada por Portinari em relação aos temas. No painel Guerra, o pintor não identifica guerra alguma, isto é, não apresenta nenhuma arma, nem cenas sangrentas, corpos dilacerados, como se quisesse dizer que, em se tratando de guerras, todas convergem, fatalmente, para o desencadeamento do horror e da bestialidade, dispensando a referencialização explícita. Dessa forma, Guerra não carrega as cores bíblicas do fogo e do sangue, nem o preto, o branco ou o amarelo: é o azul que domina. As figuras são apresentadas ora em um grupo complexo, ora com corpos curvados, em genuflexo, ora com braços levantados com mãos em súplica e cabeças erguidas com os rostos voltados para o céu.
No painel Paz, encontram-se inúmeras reminiscências de obras anteriores de Portinari. Diferentemente de Guerra, as cores de Paz são mais suaves, com matizes que transmitem uma aura de encantamento e paz naqueles que o contemplam. Em tons reluzentes, alegres e cheios de vida, as figuras se apresentam harmoniosas, comungando a fraternidade tão esperada por todos nós.
Além dos painéis, a exposição reúne cerca de uma centena de estudos preparatórios de Portinari para Guerra e Paz, incluindo obras de coleções internacionais vindas de Londres e Milão. A exposição se completa com documentos históricos, como cartas, recortes de jornais e fotografias, que contam, em detalhes, toda a trajetória de criação dos grandiosos painéis.
Vale muiiiito a pena conferir.
Guerra e Paz, Salão de Atos Tiradentes e Galeria Marta Traba.
Memorial da América Latina (Metrô Barra Funda)
terça a domingo das 9h às 18h

Quem sou eu

Mirian Rodrigues Braga é mestre e doutora em Língua Portuguesa pela PUC/SP. Especializou-se em analisar as obras de José Saramago. Em 1999, publicou A Concepção de Língua de Saramago: o confronto entre o dito e o escrito e também participou da coletânea José Saramago - uma homenagem, por ocasião da premiação do Nobel ao referido autor. Em 2001, publicou artigo na Revista SymposiuM da Universidade Católica de Pernambuco. Atuou como professora-assistente no Curso de Pós-Graduação lato sensu da PUC/SP. É professora de Língua Portuguesa e Redação no Ensino Médio e Curso Pré-Vestibular do Colégio Argumento.